Exame Genético Revela Ancestralidade e Potenciais Riscos à Saúde; Entenda o Funcionamento
SAÚDE

Exame Genético Revela Ancestralidade e Potenciais Riscos à Saúde; Entenda o Funcionamento

A análise é realizada a partir do material genético, geralmente coletado por meio de amostras de sangue ou saliva

 

Sebastião Inácio de Faria, que celebrou em 2024 o seu 102º aniversário, mantém uma vitalidade que contradiz sua idade avançada. Em seu tempo livre, dedica-se a caminhadas diárias, exercita sua mente com caça-palavras e encanta-se com a música, tocando habilidosamente instrumentos como cavaquinho, bandolim e violino. Livre de doenças crônicas graves — à exceção de uma hipertensão devidamente controlada por medicamentos — e possuidor de uma lucidez invejável, Seu Sebastião, como é carinhosamente denominado, desperta fascínio em sua família, que anseia por descobrir o segredo de sua longevidade.

Foi em busca de respostas a essa intrigante questão, bem como para validar as histórias familiares que seu avô costumava narrar, que o servidor público Jesse Carrascosa, de 41 anos, decidiu submeter-se a um teste genético em conjunto com o patriarca da família.

“Nossa família é vastíssima e a residência está constantemente repleta de visitantes. Somos imensamente apaixonados por compartilhar e ouvir histórias. Meu avô sempre mencionava que tinha parentes de origem escrava e indígena. A curiosidade nos levou a buscar um teste genético”, relata Carrascosa, em entrevista, acompanhado de Seu Sebastião. “O resultado do exame revelou que ele possui 21% de ancestralidade africana, e o mais fascinante: todas as narrativas coincidem perfeitamente.”

 

O que é o Teste Genético e Qual Sua Finalidade?

O teste genético consiste em uma análise científica realizada a partir do material genético de um indivíduo, sendo comumente extraído por meio de amostras de sangue ou saliva. “A partir desses materiais, é possível isolar o DNA para realizar, por exemplo, o cariótipo ou sequenciar genes específicos”, esclarece Rayana Maia, médica geneticista e diretora de relacionamento da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica (SBGM).

Existem duas modalidades principais de teste genético: aqueles de caráter diagnóstico, amplamente utilizados na genética médica para a identificação de doenças raras, síndromes genéticas ou predisposições hereditárias ao câncer; e os testes genéticos de natureza “recreativa”, cuja principal finalidade é avaliar a ancestralidade ou a predisposição genética a doenças, mas sem propósitos diagnósticos.

“Embora os testes recreativos possam fornecer informações relevantes sobre a saúde, é imprescindível esclarecer que não é possível estabelecer um diagnóstico a partir desses resultados”, enfatiza Maia.

 

Como Funciona o Teste Genético?

Conforme esclarece Ricardo Di Lazzaro, doutor em genética pela Universidade de São Paulo (USP) e cofundador da Genera, laboratório especializado em genômica pessoal, o genoma humano é singular, composto por aproximadamente seis bilhões de moléculas, que são herdadas de ambos os pais.

“O exame genético avalia cerca de 700 mil pontos genéticos, provenientes tanto do lado paterno quanto do materno, que apresentam variações entre os indivíduos. Embora 99,9% do DNA seja idêntico entre as pessoas, o restante, 0,1%, corresponde às diferenças que nos tornam únicos. Cada uma dessas variações possui um significado e uma origem distinta”, detalha. “Em essência, o teste examina essas centenas de milhares de pontos, correlacionando-os com informações sobre ancestralidade, riscos de doenças e características específicas, oferecendo um resultado altamente complexo”, completa.

Os pontos analisados durante o teste genético podem fornecer uma ampla gama de informações, incluindo a ancestralidade de um indivíduo, sua predisposição a determinadas doenças e outros aspectos relevantes da saúde e genética. O teste oferecido pela Genera, por exemplo, abrange dados sobre ancestralidade, risco genético, como o corpo reage a nutrientes, desempenho físico, doenças dermatológicas e longevidade.

Após realizar o teste, Seu Sebastião descobriu que possui uma predisposição genética para uma vida prolongada e um desgaste reduzido dos telômeros, sequências repetitivas de DNA localizadas nas extremidades dos cromossomos. O comprimento dos telômeros está diretamente relacionado à taxa de envelhecimento.

“Agora, a curiosidade da família aumentou: queremos saber se também temos esse desgaste reduzido dos telômeros, tal como o avô”, compartilha Carrascosa.

 

Seu Sebastião realizando o teste genético em sua casa • Arquivo da CNN

 

Como Realizar o Teste Genético?

O teste genético com fins diagnósticos deve ser requisitado por um médico. Para a realização do exame, é necessário coletar uma pequena amostra de tecido ou fluido corporal, como sangue, saliva, pele, líquido amniótico ou células retiradas da mucosa bucal. Esta amostra é então encaminhada a um laboratório especializado para análise, sendo que o resultado final é entregue ao médico que solicitou o exame ou diretamente ao paciente.

Por outro lado, os testes genéticos voltados para a ancestralidade ou para a avaliação de predisposição genética a doenças, sem caráter diagnóstico, podem ser adquiridos pela internet. Esses testes geralmente incluem um kit contendo os materiais necessários para a coleta e um manual explicativo. Quando a coleta é feita por meio da saliva, utiliza-se um swab — popularmente conhecido como “cotonete” — que deve ser esfregado na parte interna da bochecha.

O manual de instruções, em sua maioria, também orienta sobre o armazenamento adequado do swab e os procedimentos para enviar a amostra de volta ao laboratório. Após o período necessário para análise, os resultados são enviados por e-mail ou ficam acessíveis por meio da plataforma digital do laboratório.

 

Predisposição Não é Definida; Estilo de Vida Também Influencia a Longevidade e o Risco de Doenças

É importante destacar que os resultados obtidos a partir de testes genéticos voltados para ancestralidade e para a avaliação da predisposição genética a doenças, sem finalidade diagnóstica, devem ser analisados com prudência. O fato de um indivíduo apresentar um risco aumentado para o desenvolvimento de determinada enfermidade não implica, de forma alguma, que ele, inevitavelmente, a venha a contrair.

Isso ocorre porque inúmeras doenças — como câncer, diabetes e hipertensão, por exemplo — são igualmente influenciadas por fatores ambientais, como o estilo de vida, a qualidade da alimentação, a prática de exercícios físicos e outros aspectos do comportamento cotidiano.

Ao realizar um teste da Genera, por exemplo, e acessar o painel de “escala de risco genético” para doenças, uma mensagem é exibida no computador ou no dispositivo móvel do usuário: “Este exame indica, por meio da análise combinada de algumas variantes do seu DNA, um risco aumentado, padrão ou diminuído de desenvolver uma determinada doença ao longo da vida, com base no risco médio dos usuários Genera”, alerta o sistema.

“Toda a Plataforma Foi Desenvolvida para Ser a Mais Clara e Informativa Possível”: A Importância da Interpretação Profunda dos Resultados dos Testes Genéticos

“Toda a plataforma foi desenvolvida para ser o mais clara e informativa possível. Realizamos testes constantes com usuários e entrevistas para compreender se a informação está sendo transmitida de forma eficaz”, explica Di Lazzaro. “Sempre recomendamos que os resultados sejam compartilhados e debatidos com diversos profissionais de saúde”, acrescenta.

Rayana Maia, por sua vez, ressalta que os resultados dos testes genéticos podem ser de uma complexidade considerável e exigem a análise cuidadosa de um médico especializado. Ela enfatiza, ainda, que, embora os testes recreativos possam oferecer dados relevantes relacionados à saúde, eles não devem ser considerados fontes definitivas de diagnóstico.

“A maior parte dessas informações está vinculada a condições multifatoriais, e a própria base genética desses testes não é totalmente compreendida ou não apresenta uma associação claramente estabelecida com as condições [indicadas como maior risco nos resultados]”, observa.

No caso de Seu Sebastião, por exemplo, embora ele apresente uma predisposição genética à longevidade, seu estilo de vida também desempenhou um papel fundamental em seu envelhecimento saudável. “Eu gosto de fazer minhas caminhadas, não gosto de depender muito [das pessoas], preciso me esforçar e andar, embora eles não me deixem fazer muita coisa. Eles cuidam bastante de mim”, diz Sebastião, seguido de uma risada, em um tom descontraído.

“Mas eu também faço muitas palavras-cruzadas e gosto de tocar instrumentos, como cavaquinho, bandolim e violino”, acrescenta, destacando a importância dessas atividades. Elas são fundamentais para estimular a mente e mitigar os efeitos do declínio cognitivo associado ao avanço da idade.

Sebastião compartilha ainda uma dica preciosa para aqueles que almejam uma vida longa e saudável: “Meditar é uma prática excelente. Nós sobrecarregamos nossa mente. A preocupação é um veneno na vida das pessoas”, afirma, oferecendo um conselho valioso sobre o equilíbrio mental e emocional.

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