Descoberto gene que pode proteger contra a Covid-19
Pesquisadores da USP analisaram células do sangue de seis casais sorodiscordantes – aquelas histórias em que as mulheres ficaram imunes ao vírus mesmo com o maridão tossindo perto
Novo alvo
O estudo com os casais sorodiscordantes começou lá em 2020, logo no comecinho da pandemia no Brasil. Na primeira fase, os pesquisadores mergulharam no exoma – a parte do genoma onde ficam os genes que codificam proteínas – de 86 casais e perceberam uma diferença bem interessante em dois genes entre os parceiros que ficaram imunes e os que pegaram a doença. Essas variações pareciam reduzir as células NK (natural killers), que são um tipo de linfócito, mas só nos cônjuges infectados.
Com o passar da pandemia, o grupo de voluntários teve vários casos de reinfecção, mas as seis mulheres resistentes seguiram firmes na batalha contra o vírus. Para entender melhor como elas conseguiam essa proteção, os pesquisadores coletaram amostras de sangue desses casais em duas fases: uma em 2020, logo depois da primeira infecção dos homens, e outra em 2022, após a segunda infecção (e vale lembrar que nessa segunda rodada, todos já haviam tomado as duas doses da vacina contra a Covid-19).
“Com essas amostras, isolamos as células mononucleares do sangue, principalmente linfócitos e monócitos, e estimulamos elas em laboratório com um agente viral sintético que imita o SARS-CoV-2. Aí, deu pra perceber que as células das mulheres resistentes tinham uma expressão do gene IFIT3 muito mais alta, tanto em relação aos maridos quanto a um grupo de cinco mulheres que pegaram Covid-19 e desenvolveram os sintomas [grupo-controle]”, conta Vidigal.
Além de matar a curiosidade que rondava a galera desde os primeiros meses da pandemia, o estudo traz uns desdobramentos pesados. A descoberta coloca o IFIT3 como um super alvo para novas terapias antivirais, que poderiam dar aquele up na resposta imunológica natural contra o SARS-CoV-2 e outros vírus – e a proteção que vem dessa superexpressão do gene não é só contra o SARS-CoV-2, não!
“Sem dúvida, o grande resultado dessa pesquisa foi encontrar um biomarcador de resistência ao vírus. O desenho do estudo nos dá quase 100% de certeza de que essas mulheres foram expostas ao vírus e não pegaram a doença. E conseguimos reproduzir em laboratório o que pode ter acontecido nas células delas quando entraram em contato com o SARS-CoV-2”, explica Edecio Cunha Neto, professor da Faculdade de Medicina (FM-USP) e pesquisador do Instituto do Coração (InCor)